Os judeus, quer espontaneamente ou fugindo da Inquisição, vão renascer na América em outro contexto e em outra realidade. Para cá trouxeram o traquejo comercial, as técnicas econômicas e de produção e as práticas religiosas que foram preservadas no interior dos seus lares.
A partir de 1534, com a criação das Capitanias Hereditárias e a distribuição de sesmarias, para atingir os objetivos da Coroa portuguesa, foi preciso contar com novos imigrantes. Fato que serviu de estímulos para a entrada de “uma classe de gente operosa, senhora de recursos, ambiciosa, mas perseguida, e que podia ser aproveitada, era a dos conversos judeus.” (Salvador, 1976, p.242)
Quando da instalação da capital do Brasil, na Bahia, após a criação do Governo Geral no local, para onde se ergueu a cidade de Salvador havia muitos cristãos “velhos como novos”. (Cartas dos Primeiros Jesuítas, I, p. 126. Apud Salvador, 1976, p. 250)
No ano de 1536 foi instituída e solenemente proclamada a Inquisição em Portugal. Tinha início uma história que se estenderia até o ano de 1773, repleta de perseguições, denúncias, fugas, separações, temores e mortes de formas cruentas.
Aos judeus em Portugal restou, para poder sobreviver ter que viver como cristão e manter suas crenças no seu mundo interior. Passou a ser um homem dividido entre ser cristão externamente e judaico no seio da família e do lar. Para não levantar suspeitas era obrigado a viver como católico, batizando seus filhos, fazendo confissões, casando e frequentando as igrejas e enterrando seus mortos segundo os preceitos cristãos. Na sua intimidade e no seio de sua família sempre que podia, sem levantar suspeitas, procurava lembrar e realizar práticas religiosas ligadas à tradição e religião judaica.
Passaram então a ter uma existência dissimulada, vivendo às escondidas, em segredo.
Mais uma vez, em sua atribulada história, os judeus se puseram em movimento, realizaram a travessia pelo Atlântico e vieram para o Brasil, que se tornou um refúgio procurado por muitos. Aqui teve que se adaptar. Sem liberdade de culto, sem sinagoga e sem escolas suas práticas religiosas sofreram alterações. Perseguidos, apesar de adaptarem ao mundo colonial português, passaram a ser o outro, uma ameaça ao catolicismo romano em terras portuguesas. Para cá vieram motivados não apenas pela perseguição religiosa, pelo medo da Inquisição, pela insegurança e temor, mas também pelo seu espírito comercial e empresarial e a busca de riqueza.
No Brasil, aos descendentes dos judeus, como revelam os estudos da historiadora Anita Novinsky, havia três alternativas para a prática religiosa: assumir fielmente a religião cristã, seguir fielmente a religião judaica ou, que foi o desígnio da maior parte, não ser judeu nem cristão. Para poupar das perseguições, preconceitos e prisões tinha que aparentar ser católico. Como resultado, após algumas gerações, o que se nota é que o cristão novo não consegue mais retornar ao judaísmo. Perdiam a sua identidade e eram acusados de judeus pelos cristãos e católicos pelos judeus.
Para despistar passou a ser comum a adoção de outros sobrenomes, os apelidos. Os cristãos novos que vinham para ao Brasil eram aconselhados a adotar nomes não hebraicos para romper vínculos familiares e esquecer sua origem. Passavam a adotar novos nomes tipicamente católicos e portugueses. Os nomes deveriam ser dos santos católicos. O apelido seria de cristão velho e sua escolha deveria recair sobre algo que caracterizasse o convertido; ou pela sua origem geográfica, profissão, nome da propriedade ou e, principalmente pela adoção do apelido do padrinho por ocasião do batismo. Segundo o pesquisador Marcelo Bogaciovas não havia regra para a adoção do apelido o qual era de escolha da própria pessoa quando adulta.
Posteriormente, surgiram dificuldades de emigração judaica de Portugal para o Brasil, principalmente a partir do ano de 1570. Na regência do cardeal D. Henrique (1572-1580) foi expedido primeiro alvará que proibia a saída do reino, por mar ou por terra, para todos cristãos novos. Outras decisões reais continuaram a reforçar esta proibição. Somente no início do século XVII, devido às dificuldades financeiras vividas por Portugal, voltou a ser permitida aos judeus uma permissão de saída para o Brasil.
Para saber mais:
Anita Novinsky e a importância dos Cristãos Novos no Brasil. In