Na vila de São Paulo, nos seus primeiros tempos, nas incursões pelo sertão se manifestou o mesmo espírito empreendedor, aventureiro, indômito e destemido que marcou a presença dos cristãos novos nos descobrimentos marítimos em direção ao mar desconhecido. Sem receios dos perigos, das distâncias se puseram à caça aos indígenas e na busca de riquezas minerais.
Em memorial escrito pelo Padre Jesuíta Francisco Crespo, Procurador Geral das Índias Ocidentais, durante os anos de 1631 e 1636, para Sua Majestade o rei da Espanha, têm-se inúmeras páginas de acusações sobre as investidas e atuação dos bandeirantes paulistas na província do Paraguai de onde levavam os índios catequizados. As acusações enviadas pelos opositores dos bandeirantes e do judaísmo se encontram: homicídios, graves delitos, atrocidades, sacrilégios profanação das coisas sagradas, blasfêmias e maus tratos aos religiosos. Acusavam que em muitas ocasiões eles se mostravam serem hereges e judeus com muita aversão ao cristianismo. Afirma ainda o citado documento que: “muitos deles são cristãos novos e se fizeram indômitos sem conhecer a (lei) divina e humana… as crueldades e desacatos que os portugueses de São Paulo fizeram com os índios, com os sacerdotes e com as coisas sagradas são mais próprias de judeus e hereges.” (In Bogaciovas, 2015, p. 195)
Os paulistas foram por estes motivos chamados pelos jesuítas espanhóis de “judeus, hereges e de homens sem Rei, sem Lei e sem Deus” (Simão de Vasconcelos in Bogaciovas, 2015, p.252). Desta forma as acusações foram de extrema gravidade, como a de que “os paulistas quebraram as pias de água benta, jogaram ao chão os ornamentos sagrados e os santos óleos, de rasgarem uma imagem de Nossa Senhora, de atearem fogo a uma igreja, de serem judeus encobertos, de darem mostras de que eram judeus e hereges de trazerem por escárnio, nas solas de seus sapatos as imagens de Nossa Senhora e outros santos, de dizerem que se haveriam de salvar apesar de Deus, sem fazer suas obras.” (Bogaciovas, 2015, p. 253)
As mesmas acusações pesam sobre uma das maiores bandeiras que saiu de São Paulo, a de 1626, capitaneada por Antônio Raposo Tavares. Um bandeirante de origem comprovadamente judaica por parte de tio materno e por ter sido influenciando pelas práticas judaizantes na sua criação dada pela madrasta cristã nova judaizante Maria da Costa, presa e condenada pela Inquisição em Portugal. Daí a sua aversão ao catolicismo, aos padres e ter se declarado seguir a lei de Moisés. Todos os demais membros que chefiavam a expedição, portugueses moradores na vila de São Paulo e arredores, foram denunciados de terem origem judaica. Na relação dos agravos feitas pelos Padres Justo Mancilla e Simon Maceta, ambos da Companhia de Jesus, aparecem muitos nomes e dentre eles Amador Bueno e seus filhos, o capitão André Fernandes da vila de Santana de Paranaíba, Antônio Bicudo, Antônio Luís Grou, Antônio Pedroso, capitão Brás Leme e o capitão Pedro Vaz de Barros.
As acusações resultaram na criação da má fama dos paulistas e deram origem à “a lenda negra”, que considerava os paulistas violentos e aprisionadores de índios.
As referidas denúncias não impediram a continuidade do movimento bandeirantista e nem resultaram em punições para os que delas participavam. Somente em 1640 foi que a Ordem Régia assinada por D. Margarida e datada de Lisboa, a 31 de março, recomendava ao Vice Rei do Estado do Brasil, o Marquês de Montalvão, “empenho para impedir que os paulistas fizessem entradas no sertão, já que eram facínorosos, degredados deste Reino por seus delitos e gente de nação hebreia e que os índios que lhes repartem põem nomes do testamento velho.”(Bogaciovas, 2015, p. 259)
Para saber mais:
– A Conspiração do Silêncio. Uma história desconhecida sobre os bandeirantes judeus no Brasil. Raposo Tavares. Prof. Dra. Anita W. Novinsky . In:
http://www.congresojudio.org.ar/publicaciones/coloquio_nota_print.php?id=139
– Santos, heróis ou demônios? Fernanda Sposito. In:
file:///C:/Users/Sodero/Downloads/2012_FernandaSposito.pdf