O movimento de expansão paulista atingiu a região do Vale do Paraíba ao longo do século XVII e provocou a sua formação histórica no contexto do processo de colonização portuguesa.
O colonizador que adentrou pelo Vale do Paraíba procurou garantir a posse, o domínio do território e a exploração de suas riquezas, via a região como um território para ser desbravado e colonizado. Para tanto, foi preciso se adaptar às condições impostas pela natureza e desenvolver formas de produzir cultura. Porém, toda a ordem por eles imaginada tendia a ignorar o outro, os habitantes que encontrassem deveriam ser subjugados, explorados e incorporado a civilização cristã do mundo ocidental.
Para chegar ao Vale do Paraíba, partindo de São Paulo, pelo trajeto inicial da futura Estrada Geral do Sertão ou Caminho Velho dos Paulistas, o colono encontrou mais facilidade dos que os primeiros povoadores – que a partir do litoral tiveram que tiveram que transpor as muralhas da serra do Mar para alcançar o planalto paulista. O trajeto não era fácil para os que subiam por Paraty, pois tinham que vencer as asperezas do caminho velho partindo do litoral até transpor o alto da serra do Mar.
Após transpor a região serrana e adentrar pelas várzeas do Rio Paraíba do Sul havia maiores facilidades pela presença do rio, sempre uma referência nos roteiros dos viajantes, de terras férteis e muito espaço para assentamento de suas moradas. Glimer ao percorrer a região em 1601 deixou registrado que o rio Paraíba do Sul era “abundantíssimo tanto de peixes grandes, como pequenos que lhe dão o nome de rio dos Sorobis”. (Apud Pasin, 2004, 34)
No encontro ocorrido entre civilizações, os indígenas passaram a ser vistos como objeto de exploração e da catequese cristã. A exploração foi realizada pelo emprego da mão de obra nas atividades agrícolas, como auxiliares em inúmeras tarefas e nas investidas pelos sertões. Os primeiros exploradores da região deixaram registrado a presença de “oitenta flecheiros” na expedição de Antonhy Knivet (1596) (Apud: Pasin, 2004, 23). Na viagem realizada por Wilhelm Glimer (1601) ele descreve a presença dos “selvagens que tinham que carregar os mantimentos às costas” (Apud: Pasin, 2004, 34) durante o trajeto da viagem pelo interior, passando pelo Vale do Paraíba. Foram também sujeitos na catequese desenvolvida nos aldeamentos dirigidos pelos jesuítas no início da colonização e posteriormente pelos franciscanos na vila de Taubaté.
No Vale do Paraíba não houve a “guerra da conquista”. Não havia uma organização indígena estável como foi encontrada no planalto de Piratinga, nem unidade tribal capaz de se organizar para reagir à conquista portuguesa. Não se destacou nenhum líder indígena como aconteceu em São Paulo com a liderança e importância de um Tibiriça, denominado de “o senhor dos campos de Piratininga”. Até mesmo a “Guerra dos Tamoios” que se desenvolveu no litoral entre os anos de 1554 a 1567 não se tem notícia de ter repercutido na região. Os poucos grupos que nela habitavam ou que transitavam viviam dispersos pelos campos e florestas, sem contatos uns com os outros, o que facilitou a ocupação do espaço pelos novos contingentes populacionais e a submissão dos povos autóctones.
A conquista do território pelos representantes do Império português se realizou sem tensões e conflitos com os indígenas, como foi verificado na vila de São Paulo de Piratininga. Eliminada a necessidade da guerra de conquista foi imposto o sistema de escravidão indígena acompanhado de seu genocídio. Foi a vitória do mais forte – que tinha o propósito de desenvolver a colonização (visando enriquecer e inserir a nova sociedade nos moldes da civilização europeia). A partir de então se impõe a cultura única e dominante: a europeia e neste contexto, a mesma língua, costumes e religião.
No planalto de Piratininga predominou por este tempo a “língua geral”, além dos dialetos grupais e foi mantida a diversidade de línguas, de culturas e a capacidade de sobrevivência dos diversos grupos indígenas ali existentes. No Vale do Paraíba ocorreu o fenômeno inverso, a partir da imposição da uniformidade de língua e costume àqueles que no seu conjunto passaram a ser designados simplesmente por índios. Assim, cada língua e cada cultura que iam desaparecendo, portadoras de suas singularidades, seus saberes e suas relações específicas de compreensão do mundo faziam diminuir nos indivíduos a sua capacidade de adaptação e perspectiva de sobrevivência. Morriam as línguas e os portadores das mesmas.
Os indígenas encontrados em outras partes da colônia e levados para a região do Vale do Paraíba foram sendo reduzidos ao trabalho forçado, agrupados em fazendas e unidades produtivas. Aos poucos, foram sendo destruídos na sua diversidade étnica e cultural. Como resultado ocorreu o desaparecimento das suas características singulares, a perda de sua identidade tribal e o desaparecimento dos inúmeros povos.
Para saber mais:
– Vale do Paraíba: A Estrada Real: Caminhos & Roteiros. José Luis Pasin. Unisal: Lorena, 2004