A continuidade do movimento de expansão colonial, o crescimento da vila de São Paulo e de seu entorno, o estímulo à busca de metais preciosos pelos representantes da Coroa Portuguesa, o aumento e a diversificação da produção agrícola seguido do aumento da criação do gado ampliaram a demanda de mão de obra vinculando de modo irreversível a economia paulista a uma dinâmica interna de cunho senhorial e marcadamente escravista.
Em decorrência, a mesma situação se estende para a região do Vale do Paraíba. Nele, a posse da terra e o emprego da mão de obra indígena formaram a base da economia durante o período de formação regional
Na segunda metade do século XVII permaneceu a “a caça ao índio”. A forma rude, cruel e eficiente para manter o sistema econômico. As expedições passaram a representar oportunidade concreta de poder constituir uma base produtiva que possibilitasse inserir-se no processo de produção e comercialização dos produtos agrícolas.
A derrota sofrida pelos bandeirantes no sul trouxe alterações nas expedições de apresamento. Elas começaram a diminuir em tamanho médio e aumentar em número, distância da caminhada e ficarem mais dispersas quanto ao seu itinerário e região percorrida. Algumas começaram a capturar cativos nas áreas próximas a São Paulo e outras a dirigir para o centro oeste. Passaram a percorrer sertões mais distantes e menos conhecidos, trazendo quantidades cada vez menores de cativos. Aumentava assim as dificuldades para os sertanistas que passaram a percorrer distância maiores com retorno e ganhos menores, além do aumento dos perigos que tinham que enfrentar. A ambiciosa expedição de Raposo Tavares em 1648 se enquadra neste contexto. O que ele buscava era investigar a possibilidade de assaltar as missões ao longo do Rio Paraguai. A “maior bandeira” deve ter repercutido como um grande fracasso, sendo que Raposo Tavares regressou como um homem acabado e empobrecido.
A maioria das expedições de apresamento passou a operar em escala pequena, em forma de empreendimentos familiares ou por meio de contratos entre “armadores” e sertanistas. Os armadores forneciam correntes, pólvora e índios aos sertanistas e assumiam os riscos do empreendimento com a expectativa de receber metade do “lucro” da expedição, isto é, metade dos índios trazidos do sertão. Os acordos eram feitos verbalmente. Geralmente nas expedições eram chefiadas por sertanistas mais experientes que levavam consigo outros colonos e vários jovens em sua primeira experiência pelo sertão. Por vezes a Ordem dos Carmelitas em São Paulo serviu de fonte financiadora com índios e provisões e até dinheiro.
Na segunda metade do século XVII os paulistas procuravam garantir o fluxo de cativos por meio de outras estratégias. Dessa forma se articularam com os interesses da Coroa em intensificar a busca por metais preciosos e oferecendo serviços militares em defesa do patrimônio açucareiro e pecuário do nordeste.
Um dos resultados destas mudanças foi o aumento na diversidade étnica e linguística da população subordinada. A partir de 1640, com a falta de cativos Guaranis os paulistas começaram a aprisionar indígenas de grupos variados como Guaianás, Guarulhos, Puris, Coroados, Carijós, Tabajaras, e Cataguás. Essa diversidade também denunciava as dificuldades que os sertanistas enfrentavam no seu aprisionamento bem como na sua manutenção de grupos diferentes em suas propriedades devido ao aumento das rebeliões e fugas.
Outro resultado evidente foi à diminuição da população indígena escrava nas propriedades paulistas. Desde o início do século XVII começaram a aparecer nos inventários os índios forros. O que ocorria com uma carta de liberdade devidamente registrada em cartório ou que constasse no testamento do senhor. O sistema da alforria provocaria mudanças na situação do contingente indígena.
No Vale do Paraíba, notadamente na vila de Taubaté, a quantidade e a procedência dos cativos foram se modificando ao longo do século XVII. Segundo os dados apresentados pela historiadora Kátia Mendonça, na vila de Taubaté o número de plantel médio com maior número ocorreu na década de 1650-1659, com média de 18,4 cativos sob o comando de nove proprietários rurais. Corresponde a fase áurea do apresamento. E, este número entra em declínio em décadas posteriores até reencontrar um novo crescimento na década de 1690 a 1699, com a posse média de 10,86 cativos no total de 30 propriedades. Este período corresponde à fase áurea da busca e da descoberta dos veios auríferos em Minas Gerais.
Ao final do século XVII, as Cartas Régias de 26 de janeiro e 19 de fevereiro de 1696 reconheciam formalmente os direitos dos colonos em administrar os indígenas, consolidando assim outra forma de serviço obrigatório que não a escravidão. Ficava claro que a política indigenista estava inserida nos quadros do sistema colonial. Os indígenas cativos passaram a ser designados pelo nome de administrados. E, eram dispostos pelos colonos como escravos, dando-os em dotes de casamento, e aos seus credores como pagamento de dívidas. Este mesmo documento também proibia expressamente o casamento entre índios administrados e índios de aldeamentos, bem como entre administrados e escravos africanos. Ia se consolidando no cotidiano da vida colonial que os indígenas eram livres pelas leis do reino, mas pelo costume da terra eram de serviço obrigatório e necessário para o sucesso dos empreendimentos levados a cabo pelos paulistas.
A questão do recrutamento e emprego da mão de obra indígena se estendeu por todo o século XVII. De início procurou atender as necessidades dos colonos paulistas e foi de encontro aos interesses da procura por minerais estimulados pela coroa. No final do século o apresamento foi superado pelo envolvimento com a mineração e ao comércio inter-regional.
O sertanismo de apresamento já estava com seus dias contados e teve seu epílogo com as com as grandes descobertas do ouro, entre 1693 e início do século seguinte.