O desconhecimento do outro
A imagem dos indígenas foi construída à sombra da cultura do colonizador. As características observadas no contato com os diversos grupos indígenas que habitavam o Vale do Paraíba fizeram com que os europeus adotassem a prática de rotular estas populações por meio da criação de etnônimos. Atribuição esta “fruto de uma incompreensão total da dinâmica étnica e política dos ameríndios” (Viveiro de Castro, apud Lopes, 2014, p.11) Enfim, do desconhecimento e da visão preconceituosa do outro.
O ato de “nomear pessoas” nos séculos iniciais da colonização estava, antes de tudo, enraizada na ideia de uma representação advinda do mundo ocidental, no desejo de formar um homem e uma sociedade semelhante à europeia. Disso acabou por classificar os povos subordinados em categorias naturalizadas e estanques. Os europeus construíram a “imagem dos índios” à sombra de sua própria cultura. Tinham como fundamento o traço do homem em geral, o seu desenvolvimento no mundo ocidental e a visão de sua superioridade natural.
Com este paradigma os descobridores conheceram os índios; os conquistadores conheceram e procuravam compreendê-los para dominá-los; os religiosos os conheceram, compreenderam e até amaram. Porém, nenhum deles os respeitou. O resultado do choque de civilizações resultou então no extermínio de milhões de pessoas pertencentes aos diferentes povos indígenas da América durante o período colonial. Sob vários pretextos e diversas formas, como assassinatos feitos durante guerras ou fora delas, maus tratos, escravidão, por doenças contraídas em contato com o homem branco, parte da população autóctone foi sendo eliminada para garantir as ambiciosas empreitadas da metrópoles europeias.
Este processo de conquista, dominação e extermínio dos povos primitivos da América, de certa forma e com particularidades específicas, repetiu-se na conquista do território do Vale do Paraíba.
É preciso reafirmar que a reconstituição da história dos diferentes povos indígenas encontrados pelos colonizadores é uma tarefa árdua e complexa. Como lembrou Egon Schaden, “às lacunas de informação em livros e documentos não chegamos, na maioria dos casos, a estabelecer com razoável segurança o processo decorrido desde os contatos iniciais entre os índios e os conquistadores europeus. Ninguém sabe de quantos grupos a única memória que existe é apenas o nome tribal ou, talvez, um apelido qualquer dado por índios vizinhos ou invasores brancos”. ( In Reis, 1979, p.8) Acrescente-se a isto que o movimento gerado pela caça ao índio iniciado no planalto paulista desestabilizou as organizações indígenas, por retirar os grupos locais de seus habitat e por vezes introduzir grupos de diferentes procedências étnico culturais. Ou, ao longo do tempo a influência da visão europeia atribuindo o caráter de incivilizado, exótico ou extravagante tão comum nos textos dos cronistas e viajantes europeus, geraram confusão e impropriedades sobre os mesmos, sobre sua história de vida na região.
Para saber mais:
– A conquista da América: a questão do outro. Tzvetan Todorov.
Disponível em: https://portalconservador.com/livros/Tzvetan-Todorov-A-Conquista-da-America.pdf