#tempodemovimento | Parte II – O Paulista | Encontros e desencontros

Na vila de São Paulo não aconteceu “a guerra da conquista” como em outras áreas do continente americano descobertas e dominadas pelos espanhóis, notadamente no México e no Peru.  Tampouco a perseguição e a feracidade praticada naqueles territórios responsável por “perpetrar o maior genocídio da história da humanidade”.  (Todorov, 1991, p.6)  Desde o início da organização da vila existiu a aproximação de uns com os outros estimulados por certas empatias e movidos pelas necessidades de superar as dificuldades e manter a sobrevivência.

Porém, é preciso lembrar, que durante o século XVI os Campos de Piratininga foram palcos de perseguições e conflitos entre colonos e os indígenas resultantes dos interesses dos primeiros em obter mão de obra escrava para a lavoura canavieira no litoral vicentino.  Dada a diversidade destas relações não se pode determinar uma hierarquia rígida entre o relacionamento dos brancos com os representantes de diferentes povos indígenas.  O que sobressaiu foi um sistema móvel que passou a expressar a posição e influência de cada um na formação de São Paulo.

Por diversas ocasiões grupos indígenas manifestaram a resistência ao domínio europeu gerando conflitos armados.

Em 1562 vários grupos chefiados pelo chefe Jagoanharo, pintados, emplumados, armados de arco e flecha, assaltaram a povoação.  A destruição completa do Colégio foi evitada pela ação do cacique Tibiriça que deu tempo à chegada de socorro vindo de Santos, sob o comando de Brás Cubas. Em 1590 foram desfechados novos ataques, agora dos tupiniquins, devastando aldeias e queimando igrejas, levante combatido durante seis anos pelo capitão-mor Jerônimo Leitão.  Em 1591, outra expedição, retornando do sertão foi atacada perto de Santana de Parnaíba.

O maior conflito ocorreu entre os anos de 1554 a 1567 denominado de Confederação dos Tamoios. Ele representou a “coalizão de diferentes coletivos tupi da costa quinhentista que pôs em risco a colonização portuguesa, tendo como pano de fundo a disputa entre franceses e portugueses pela região da Guanabara, hoje Rio de Janeiro” (Moisés e Sztutman, 2010, 1)  Nela participaram várias tribos indígenas do litoral, especialmente os Tupinambás, Guaianazes, Aimorés e Terminós.

A sua origem esteve ligado ao início da ação de aprisionamento dos indígenas por parte dos vicentinos que procuravam obter mão de obra escrava para o trabalho nas plantações de cana- de – açucar.  A partir de então ocorreu a caça aos indígenas, dentre eles os da tribo dos Tupinambás.  Por ordem de Brás Cubas muitos foram mortos e presos, como o chefe da tribo, Kairuçu e o seu filho Aimberê.

Aproveitando o enterro de seu pai, morto por maus tratos sofridos no cativeiro, Aimberê conseguiu fugir tornando-se o novo líder dos Tupinambás. Reuniu-se com os chefes de outras tribos que ocupavam uma área litorânea que ia desde Bertioga (SP) até Cabo Frio (RJ),  e juntos deram inicio a Confederação dos Tamuya (Tamoios em português), que em Tupinambá significa “o mais velho”. Esta aliança tinha como principal objetivo combater os portugueses e todos que os grupos indígenas que o apoiassem.

Os Tamoios foram favorecidos com o apoio dos franceses que haviam  desembarcado no Rio de Janeiro,  em 1555, liderados por Nicolau Durand de Villegaignon,.  Deles receberam armas em troca da permanência em terras brasileiras.

A chefia da Confederação dos Tamoios foi assumida por Cunhambebe, líder de uma aldeia próxima de Angra dos Reis. Conhecido por ser valente e destemido, marcou história devido a suas grandes batalhas contra os portugueses. Faleceu após um surto de doenças contraído pelo contato com os brancos.  A luta continuou, sob o comando de Aimberê e acabou por vencer os guaianazes  que defendiam os portugueses.

 

Para tentar apaziguar os envolvidos na luta os jesuítas foram enviados para o local.  Os padres José da Nóbrega e José de Anchieta chegaram na tribo de Iperoig  (hoje Ubatuba-SP), em 1563.  Após negociação de paz entre portugueses e tamoios, os jesuítas conseguiram convencer os indígenas de ir para São Vicente para fechar um tratado de paz. Com o acordo firmado  Aimberê conseguiu  a libertação dos índios aprisionados. No entanto, após breve período os portugueses se fortaleceram e continuaram a caçar e a escravizar indígenas.

Temendo a liberdade e sabendo da grande desigualdade, os Tamoios não se intimidaram e continuaram a luta com apoio dos franceses.   A guerra se estendeu por um ano, até que se encerrou no dia 20 de janeiro de 1567, com a morte do grande guerreiro Aimberê.

A Guerra dos Tamoios serviu para comprovar a capacidade das populações indígenas de resistir de forma organizada a conquista dos brancos europeus.  Mas, revelou a inconsistência do sistema organizatório tribal para conseguir tal objetivo.  Pelo conhecimento da terra, pela preponderância demográfica e pela iniciativa dos movimentos poderia levar a crer que venceriam os portugueses.  No entanto, “o sistema de alianças tradicionais era insuficiente para dar sustentação à empreitada tão vasta. As alianças circunstanciais fragmentaram-se, voltando ao padrão normal de subordinação aos interesses estrangeiros” (Arruda, 2011, 72).

Para saber mais:

– – MOISÉS, Beatriz Perrone; SZTUTMAN, Renato.  Notícias de uma certa Confederação Tamoio.   In: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-93132010000200007.